Acima de Qualquer Suspeita ganha reboot
Em apenas três anos o best seller virou um filme, estrelado por Harrison Ford, acumulou milhões nas bilheterias e caiu no esquecimento. No entanto, graças à David E. Kelley, ex-advogado ele mesmo, o livro volta a ser explorado agora em formato de minissérie, estrelada por Jake Gyllenhaal e com a estreia antecipada pela Apple Tv Plus para o início de junho, dia 12. Seria mesmo necessário?
O Best Seller e a surpresa sobre o culpado
Como foi divulgado, a série de 2024, será “reimaginada” e vai explorar mais profundamente alguns dos temas que no filme ficaram à parte: obsessão, sexo, política e poder assim como os limites de um amor doentio.
Tudo isso enquanto o acusado, o advogado Rusty Sabich (Gylenhaal) luta para manter sua família e seu casamento unidos durante o duro processo de investigação e julgamento. O que fica no ar é se vão manter a grande surpresa do final da história, tão conhecido 37 anos depois.
Em 1987, Acima de Qualquer Suspeita (Presumed Innonent) fez de Scott Turow, em seu primeiro romance, um fenômeno.
A história é sobre um promotor acusado do assassinato de sua colega, uma promotora atraente e inteligente chamada Carolyn Polhemus. Contado na primeira pessoa, acompanhamos a angústia de Rusty para escapar de uma condenação enquanto tenta decifrar o crime.
Tudo é estranhamente suspeito. Ele e Carolyn foram amantes e pelo que a polícia percebe, ela parece ser vítima de um encontro sexual que deu errado porque ela morta por um único golpe no crânio com um objeto desconhecido enquanto estava amarrada. Rusty é suspeito porque encontram seu semen na promotora, embora ele saiba que o romance entre os dois tenha acabado há um tempo e que ele não é o culpado.
Desculpem que não vou poupar spoilers aqui.
Carolyn, como era típico nos anos 1980s, que é uma mulher ambiciosa e independente, é apresentada como uma pervetida, insensível, manipuladora e ambiciosa, em contraste com Barbara (Ruth Negga), a esposa dedicada e sofrida de Rusty. Barbara, pelo que ostensivamente sabemos, perdoou e apóia Rusty, mas no passado precisou de ajuda psiquiátrica quando teve uma crise nervosa ao saber da traição do marido.
Há toda uma subtrama política de promotores e advogados correndo ao fundo, e quando Rusty é acusado, ele vai a julgamento mesmo que as evidências sejam circunstanciais. No local do crime havia um copo com suas impressões digitais, registros de ligações dele para Carolyn, fibras de um tecido de carpete da casa dele e claro, seu esperma na vagina de Carolyn. Como o copo “desaparece”, isso interfere no processo e aos poucos Rusty vai descobrindo o pior lado de Carolyn, incluindo romances com outros homens poderosos, o que parece ser o motivo de seu assassinato, com Rusty sendo o bode expiatório.
Como na Justiça as pessoas são inocente até que provem ao contrário e tem que ser acima de qualquer suspeita, Rusty é “inocentado”. Porém aí vem a virada: ao longo do tempo, seu relacionamento Barbara só piora, e ela decide se separar dele. Apenas então ele entende que foi Barbara que matou Carolyn e fez parecer que o marido fosse o culpado.
Ela queria se vingar dos dois, mas, em especial, da mulher que quase destruiu sua família. A surpresa – desde então – vem sido usada para várias reviravoltas em histórias sobre crimes.
No livro a história termina em aberto, sem que Rusty denuncie Barbara. A partir desse livro, Scott Turow escreveu outros romances, incluindo a continuação – Innocent – lançada em 2010. Dessa forma, a série da Apple TV Plus tem toda cara que vá unir os dois romances.
Sucesso no cinema, mas nada de grandioso
Como Hollywood amava “filmes de tribunal”, um suspense jurídico que vendeu milhões de cópias era algo esperado para virar filme, e, em 1990, o diretor Alan J. Pakula lançou o longa estrelado por Harrison Ford, Brian Dennehy, Raúl Julia, Bonnie Bedelia, Paul Winfield e Greta Scacchi.
Os direitos do romance tinham sido comprados antes mesmo do livro chegar às lojas, mas escrever um bom roteiro foi um processo demorado e que mudou de mãos até chegar à Pakula.
Acima de Qualquer Suspeita (Presumed Innonent) foi a oitava maior bilheteria de 1990, arrecacando mais de 220 milhões de dólares. Ganhou uma minissérie de televisão, The Burden of Proof, em 1992, e filme feito para TV, Innocent, em 2011, mas não virou um clássico. Talvez porque tenha sido vítima do tempo, afinal, por decisão do diretor, o conceito de justiça passou a ser central para a história, mesmo que a devassidão da vida pessoal de Carolyn pudesse ter alguma atração também.
As tentativas de continuação foram frustradas
O primeiro spin-off de Acima de Qualquer Suspeita (Presumed Innonent) explorado na TV foi a minissérie The Burden of Proof, 1992, acompanhando o advogado de defesa Sandy Stern (Héctor Elizondo), que investiga o passado de sua esposa após seu aparente suicídio. Depois, com o lançamento de Innocent, o filme feito para TV é ambientado vinte anos após o assassinato de Carolyn, com Rusty Sabich (Bill Pullman) agora sendo acusado do assassinato de sua esposa, Barbara (Marcia Gay Harden). Exibido na TNT em 2011, não gerou nem polêmica nem grandes ondas de reconhecimento no público.
Diante disso tudo é irônico imaginar que David E. Kelley tenha decidido resgatar essa história para sua série na Apple TV Plus. Ele desenvolveu o roteiro com J. J. Abrams e traz Jake Gyllenhaal em mais uma refilmagem de um filme dos anos 1990s. Depois do que vi em Matador de Aluguel (The Roadhouse) estou duplamente cínica quanto à necessidade ou expectativa do reboot de Acima de Qualquer Suspeita (Presumed Innonent).
Outro problema que vejo para a série, antes mesmo de sua estreia, é que o reboot de Atração Fatal pescou muito do que pode estar em Acima de Qualquer Suspeita (Presumed Innonent). Ou seja, mais do mesmo.
Será que dessa vez Jake acerta?